terça-feira, 21 de outubro de 2008

Uma estranha na Mostra

Alguns amigos me acham “alternativa”. Já virou até motivo de piada, quando vamos ao cinema o pessoal já pergunta: “Foi a Giovana que escolheu o filme?? Xiiiii....”. Nada contra, eu me divirto e não faço o menor esforço pra mudar essa imagem! O problema é que descobri que eu, como alternativa, ainda sou muito careta. Tudo por causa da 32ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Pra começar, esta é a 32ª (trigésima segunda!) Mostra realizada por aqui e a primeira de que eu participo. Pra falar a verdade, acho que é a primeira de que eu tomo conhecimento. Posso até ter ouvido falar dela nos outros anos, mas era uma informação que passava despercebida.

Esse ano não só tomei conhecimento como me empolguei e resolvi me aventurar pra valer nessa maratona. Mas a primeira dificuldade veio logo de cara, na minha primeira “cheirada” no site oficial do evento: como escolher entre quase 500 filmes diferentes, dos quais eu nunca ouvi falar?! Fiquei completamente desnorteada. Acabei fazendo uma pequena seleção baseada em comentários de jornais e nos meus instintos. Como isso não foi suficiente, tive que aplicar também o critério geográfico, fazendo escolhas que contemplassem os lugares mais variados do planeta onde se faz cinema, do Japão até a Etiópia. E completei buscando também escolher salas variadas, aproveitando assim pra “dar uma geral” nos cinemas de São Paulo.

Bem, a maratona começou e a experiência até agora tem sido.... interessante.

Eu diria que as pessoas que freqüentam a Mostra são, estas sim, alternativas (pra provar, mais uma vez, que tudo é relativo!). Uma das primeiras curiosidades que matei foi como as pessoas arrumam tempo para ver três, às vezes até quatro filmes por dia. Descobri que muita gente tira férias só pra acompanhar a Mostra. Também reparei que, neste circuito “alternativo”, a moda entre os homens é ter barba. “Osamas Bin Laden” estão aos montes por aí assistindo filmes B. Vi até um que tinha uma espécie de trança na barba, como um penteado preso com elásticos, não sei bem como descrever. Muito criativo, nunca vi nada parecido. Sapatos e óculos coloridos são a regra. Mulheres de cabelos curtos e homens de cabelo comprido também. Enfim, tudo aquilo que seria considerado ultra-subversivo no meu mundinho “Dilbert” era o padrão ali. Acho desnecessário mas prudente esclarecer que isso não é nenhum juízo de valor, apenas observações de uma espectadora muito curiosa.

Os filmes que vi até agora também só me fazem pensar que ainda sou muito principiante no mundo alternativo. Comecei com Ingmar Bergman, que ganhou uma retrospectiva especial nessa Mostra. Vi Sede de Paixões, um filme com algumas cenas realmente brilhantes, mas cuja mensagem não me fisgou. Na verdade acho que não entendi a mensagem. A meu ver o filme bem que poderia se chamar Mulheres a Beira de Um Ataque de Nervos, se bobear o Almodóvar se inspirou aí pra fazer o seu... A personagem principal, uma ex-bailarina chamada Rut, era tão irritante que acho que se eu a encontrasse na rua eu bateria nela! Se era essa a intenção do Bergman, ele teve sucesso!

O segundo filme com certeza vale muitos créditos para o meu diploma de alternativa. É um filme do Cazaquistão chamado Tulpan, sobre um rapaz que, na contra-mão do que se esperaria de um jovem nos dias de hoje, prefere viver no meio do deserto como pastor de ovelhas ao invés de viver na cidade. E tem que lutar para isso. Achei fantástico poder ver como vivem famílias isoladas no meio das estepes do Cazaquistão, afinal, onde mais eu poderia ver esse tipo de coisa? E tudo muito realista e com boas doses de humor. Mas ainda não sei se gostei de ver uma ovelha dando à luz e o rapaz fazendo respiração boca-a-boca no filhotinho recém-nascido para salvá-lo. Talvez ainda seja um pouco demais para mim...

No fim das contas o que eu mais gostei mesmo até agora foi de ver O Poderoso Chefão na telona. Foi uma experiência inesquecível (morram de inveja, hahaha). Michael Corleone continua arrancando suspiros...

Mas ainda tem muito mais pela frente. Muito mais Ingmar Bergman, muito filme chinês, japonês, polonês, francês, belga, alemão, chileno e até americano! Quem sabe até o final da Mostra eu já não estou me sentindo uma insider?!

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Todo mundo tem uma história com a Sonata ao Luar

Exagero? É, sim, mas como título soa bem!
O caso é que eu já ouvi várias histórias relacionadas com essa música. Sempre que se fala dela alguém comenta: “Nossa, a minha mãe tocava essa música” ou “Puxa, eu aprendi a tocar essa música para o fulano”. É uma música conhecida, claro, mas de um jeito diferente. Parece que ela tem uma vocação pra ficar associada com acontecimentos ou pessoas na nossa memória.
Eu tenho uma história com ela também, que contarei agora. Se você conhecer alguma, conte aqui também!
Quando eu estava no 2º colegial, conheci a Tarsila. Tarsila se mudou para a escola em que eu estudava no segundo ano e logo ficamos amigas. Como nós duas achávamos aquela escola fraca demais e nós duas tínhamos o objetivo de passar na Fuvest, resolvemos estudar juntas por conta própria, todas as tardes. Ela morava perto da escola, então a casa dela acabou se tornando nosso quartel-general. Eu ia para lá quase todos os dias depois da aula e assim passamos muitas tardes juntas. Como ninguém é ferro, muitas vezes a gente não estudava coisa nenhuma e gastava horas conversando sobre a vida. Provavelmente aprendi mais nessas conversas do que com as apostilas do Anglo...
Bem, na casa dela também havia um piano e Tarsila tocava muito bem. Ela era uma artista até o último fio de cabelo, impetuosa e frágil como só os verdadeiros artistas sabem ser. Sabia desenhar, escrever, cantar, tocar piano e se meter em confusão como ninguém. Numa dessas tardes, ela tocou uma música chamada Sonata ao Luar, da qual eu nunca tinha ouvido falar, mas que nunca mais esqueci. Naquela época eu não sabia nada de Beethoven. Sabia que era um desses compositores mais famosos, talvez aquele que tinha ficado surdo, mas eu não tinha muita certeza, eu sempre confundia Beethoven e Mozart. Mas o meu coração já sabia quem era Beethoven e reconheceu naquela música algo de muito especial que só começaria a se revelar anos mais tarde.
Depois disso ainda pedi para que ela tocasse a sonata muitas outras vezes. Não todos os dias, porque não é todo dia que pede Beethoven, mas sempre que sentia necessidade de retornar àquele refúgio secreto no coração, àquele lugar ainda desconhecido, mas tão familiar.
Essa é a minha lembrança com a Sonata ao Luar. Em meio ao turbilhão de sonhos e medos da adolescência, aquele oásis, aquele mundo paralelo, alheio de todas as preocupações mundanas, que a Tarsila criava quando tocava a Sonata ao Luar.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Surpresa do dia

A já mencionada Leane, a mesma da frase do dia, estarreceu-me ao revelar que o clássico Perfume de Mulher, com Al Pacino, é na verdade uma regravação de um filme italiano, Profumo di Donna, de 1974! Tudo porque esta cinéfila fora de controle reparou que um dos atores do filme Caos Calmo, Alessandro Gassman, era filho do ator principal de Profumo, Vittorio Gassman. Ah, esses meus amigos me enchem de orgulho!

Confiram:

http://www.imdb.com/title/tt0072037/

Frase do dia

“Eu gosto de filme italiano mas eu quero pipoca!!!”

(da minha querida amiga Leane, revoltada após descobrir que o Reserva Cultural, o cultuadíssimo cinema conceito que escolhemos para ver o filme Caos Calmo, não vendia pipoca)

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Mais um filme. Eu não resisto...

Do jeito que vamos parece que eu sou uma deslumbrada que gosta de qualquer coisa que vê, não? Mas o fato é que eu realmente fui agraciada com ótimos filmes ultimamente.

A vida secreta das palavras, este é o filme-assunto de hoje. Outro roteiro impecável, que mostra o que tem que ser mostrado, esconde o que tem que ser escondido e insinua o que tem ser insinuado. Tudo a seu devido tempo, tudo no seu devido ritmo. Parece simples depois de pronto, mas cansei de ver filmes que erraram a mão nesse quesito. E é o tipo de coisa que, quando bem feita, passa despercebida.

O filme aborda de uma maneira inusitada um assunto pra lá de tenebroso. Na verdade seria incorreto afirmar que o filme “é sobre esse assunto”. O filme é algo que eu não sei definir. Uma história de amor? Um drama? Um mistério? Talvez tudo isso. Mas o fato é que “o assunto” me tirou o sono. Lembrei-me de quando eu via filmes de terror quando era criança e, pra conseguir dormir depois, eu ficava repetindo, como um mantra: “não é de verdade, não é de verdade, aquilo não existe”. O problema é que neste caso é tudo verdade, e isso dói na alma.
Em Ensaio Sobre a Cegueira Saramago mostra como a precariedade das condições materiais pode transformar humanos em animais. Este filme me leva a pensar que outras condições levam homens a se tornarem animais. A que profundos infernos um homem tem que descer para cometer as atrocidades de que ouvimos falar todos os dias? Quando o assunto é o holocausto, por exemplo, todo mundo se lembra de Hitler. Incontáveis livros e filmes já contaram sua história, na escola aprendemos tudo sobre ele e sempre que alguém precisa de um exemplo de pessoa má o nome que vem à mente é esse. Hitler virou um símbolo de maldade. Mas o aspecto dessa história que estranhamente eu nunca ouvi falar é: quem foram as pessoas que operacionalizaram o holocausto? O que levou aqueles homens a passarem por cima do mais rudimentar senso de moral e executarem pessoas inocentes? Quando se fala de um assassino em particular, de um torturador, pode-se até achar explicações “plausíveis”, como distúrbios mentais, ambição desmedida ou qualquer coisa assim. Mas quando centenas, por vezes milhares de homens, se juntam para cometer atrocidades, qual é a explicação?

Anyway, esqueçam “o assunto”. O filme é delicado e intenso, para ser experimentado sem pressa. Tenho certeza que um monte de gente dirá que é muito parado, e é mesmo, mas isso faz parte da experiência. Relaxe e assista. Você verá como a história vai se infiltrar nos confins da sua memória e, mesmo muito tempo depois, você se pegará pensando nela, sem perceber.

There are very few things… silence and words.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Brainstorming

Não há mais tempo. E o que você fez? Sentou com as pernas pra cima? Tocou sirene, soltou pum, deu a descarga?
Aprendeu inglês e nunca usou? Leu a tradução e não entendeu? Colocou os óculos e não enxergou? Tentou brigar e deu mau jeito nas costas?
Hoje eu não sei, mas amanhã saberei. Por ora olho a revista e escrevo neste caderno e penso em Machado de Assis. Penso em tudo que não precisava ter feito. Penso que bebi café demais. Que conversei pouco com meus pais. Que a beleza está até na bolsa florida de Parati e nas pessoas extraordinárias que ma venderam. E que valeu a pena ter estado lá e visto essas pessoas que existem de verdade e me fazem acreditar um pouco mais na humanidade.
Um sorriso perfeito é raro. E eu tenho procurado nos lugares errados. Mas aos poucos o campo de sorrisos vai florescer e encher os olhos de deus e até ele vai se surpreender com o que as suas criaturas são capazes de fazer.

("despejado" em algum dia qualquer entre Julho e Agosto de 2008)

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Frases para a posteridade de "Into the Wild"

São frases que eu gostaria de ter escrito? Não sei, acho que é mais do que isso. E acho que não importa. O que vale mesmo é pensar a respeito.

I think careers are a 20th century invention and I don't want one.

…rather than love, than money, than faith, than fame, than fairness... give me truth.
(sobre o que os pais deveriam dar a seus filhos)

And I also know how important it is in life not necessarily to be strong but to feel strong. To measure yourself at least once. To find yourself at least once in the most ancient of human conditions. Facing the blind death stone alone, with nothing to help you but your hands and your own head.

Happiness only real when shared.

Cenas de uma tarde de quinta-feira

12:41. Horário de almoço nas obras da linha amarela do metrô. Sentados ao redor de uma comprida mesa de madeira, rente à rua, os operários avançam sobre suas marmitas. Numa ponta da mesa, os que já acabaram a marmita jogam dominó, muito empolgados. Ainda tem gente que joga dominó, não é incrível? Aquela foi uma das cenas mais bonitas que vi ultimamente. Tive um enorme desejo de ser um deles...

14:50. Perambulando pelas ruas do bairro acabei caindo numa viela mais residencial, tranqüila e pacata, onde alguns estudantes conversavam animadamente sentados na calçada. Passando por eles ouvi um trecho da conversa: “Barro não é cor!!!” Eles estavam jogando stop! Não é incrível? As crianças ainda jogam stop... Mas concordo com o rapaz, barro não é cor, hehehe.

17:01. Subindo a Teodoro Sampaio, distraída, me assusto com um ronco estridente ao meu lado, aquele “vrrrrruuuuuuuummmm” de carro acelerando sem sair do lugar. Olho pro lado e vejo um carro de auto-escola com uma garota apavorada ao volante. Depois de mais alguns “vruuuuns” o carro finalmente andou, meio aos trancos, o corpo dela e do instrutor sendo lançados pra frente a cada impulso. Exatamente como eu fazia quando estava aprendendo a dirigir. As pessoas ainda sofrem pra aprender a usar a embreagem, não é incrível? Não pude conter o riso, não riso de escárnio, mas riso de simpatia. O cara da loja de instrumentos em frente também riu. As pessoas ainda riem, não é incrível?

17:32. Carros de bombeiro e polícia em frente ao meu prédio. Entro normalmente, aparentemente não é nada no meu prédio. Enquanto aguardo o elevador chega uma senhora esbaforida e tagarela, carregando mais sacolas do que conseguia agüentar. Entramos no elevador, ela comenta: “Eu acho que quem tenta se suicidar é muito covarde e muito corajoso” Então era isso... “Alguém se suicidou?”, eu perguntei. “A moça no prédio em frente, está lá, na janela, mas parece que desistiu de se jogar”. As pessoas ainda tentam se matar, não é incrível? E ainda desistem.

Um dia fascinante.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

To Joyce or not to Joyce

James Joyce está aqui na minha frente, acenando e sorrindo pra mim. Ele sabe que eu estou, como o jovem Stephen Dedalus, rente ao coração selvagem da vida. E por isso me chama, docemente. Eu não sei. Mergulhar neste oceano chamado James Joyce pode ser uma escolha sem volta. Talvez eu precise encontrar a minha própria Dublin. Talvez eu a encontre através dele. Talvez seja hoje. Talvez seja amanhã. Não sei e não me preocupo, pois sei que saberei quando for a hora.