sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Imbróglio da USP - faltou o item 7

Eu sempre esqueço algum coisa, que droga! Mas vai lá agora:

7) Acho impressionante a força de vontade desses manifestantes. Eles estão dispostos a ser presos por sua causa. Presos! Agora imagine se toda essa energia fosse usada para causas como o combate à corrupção, a luta por uma reforma política que impeça a eleição de Tiriricas da vida, a elevação da qualidade do ensino básico no Brasil, entre outras? É claro que a USP tem problemas e que ninguém melhor do que os estudantes da USP para lutar por melhorias lá. Mas me parece desproporcional a energia que eles gastam para combater a coitada da polícia, enquanto tem problemas muito mais sérios por aí aguardando gente disposta a enfrentá-los. Acho realmente lamentável que tanta força de vontade seja gasta em causas que, se não estão completamente equivocadas, pelo menos estão longe de ser prioritárias.

O imbróglio da USP e aprendendo a pensar


1) Primeiro, vamos definir o que é violência. Para mim, violência não é apenas porrada, mas é qualquer forma de coerção física. Assim, quando os militantes fecham as portas do prédio da Letras e colocam as carteiras no meio do corredor me impedindo de ter aula, eu considero isso um ato de violência. Eu não fui convencida com palavras a não ter aulas. Eu fui impedida fisicamente de ter aula. Do mesmo modo, quando um grupo de militantes invade um prédio da USP, impedindo os funcionários de trabalhar, isso também é violência. E não quero nem entrar no mérito de depredação, até porque eu sei que é difícil provar quem fez o que e a imprensa adora fazer um sensacionalismo com o bordão “eles estão destruindo o patrimônio que foi pago com nossos impostos!”. Eu não caio nessa. Mas, por outro lado, eu considero que a invasão, POR SI SÓ, já é um ato de violência, passível, portanto, de repressão policial.

2) Falando de repressão: o que aconteceu na reitoria, a meu ver, não foi repressão à liberdade de expressão, mas sim repressão à manifestação violenta de opiniões (vide definição de violência acima). Nunca é demais relembrar que a sua liberdade termina onde começa a dos outros. A polícia, ao retirar os manifestantes do prédio, não estava reprimindo a liberdade de expressão, ela estava devolvendo às pessoas que trabalham naquele prédio o direito de ir e vir. Ou seja, ela estava devolvendo aos funcionários a liberdade que os manifestantes tiraram!

3) A justificativa implícita para tais manifestações violentas é que não existe diálogo com as autoridades e que portanto só com atitudes extremas é que os estudantes conseguem chamar a atenção para suas causas. Ora, falando desse jeito até parece que estamos na China ou no Irã! Temos um governo de esquerda no poder há mais de 8 anos, oras bolas! E existem, sim, outros meios de chamar a atenção para suas causas. Vocês ainda só não descobriram porque não pararam para usar a massa cinzenta que preenche essas cabeças. Só reforçando o óbvio, então : não existe cenário político que justifique a suspensão dos meios democráticos de decisão. Não estamos em estado de sítio, não estamos em estado de exceção, como ouvi alguns dizerem lá na FFLCH.

4) Minha resposta para o pequeno questionário sobre as blitz da polícia é: NDA. Quando vejo uma blitz, eu acho que o policial está fazendo o seu trabalho. E seu eu for parada, oh, meu deus, o que acontecerá?! Eu mostro os documentos, respondo às perguntas que me forem feitas e pronto! Engraçado que vocês consideram ser parado numa blitz violência, mas invadir um prédio, não! Sinceramente, reclamar da polícia fazer o seu trabalho me parece totalmente fora de propósito. Sem contar que com isso vocês estão atacando a INSTITUIÇÃO polícia como um todo. Num país que precisa tanto fortalecer suas instituições, nada poderia ser mais estúpido. Se a polícia faz uma triagem baseada em preconceitos, se age de forma truculenta, são outros quinhentos. Acredito que isso aconteça, sim, mas também acredito que seja exceção. Generalizar e desacreditar o trabalho da polícia como um todo é um erro grave. A polícia pode ter, sim, os seus problemas. Com certeza tem policial corrupto, com certeza tem preconceito, mas até prova em contrário continuo acreditando na instituição. E confiando nela pra me defender.

5) Aulas de literatura. Vamos analisar a frase: “Queremos na USP uma polícia com treinamento em direitos humanos”. Você vê algo de errado nessa frase? À primeira vista não, afinal, quem, em sã consciência, veria algo de errado em pedir cumprimento dos direitos humanos? Mas como eu prestei atenção nas minhas aulas de literatura, eu aprendi a enxergar além da superfície de um texto. E o que eu leio nas entrelinhas aqui é: “Nós da USP somos especiais e merecemos tratamento especial. Se a polícia lá fora não respeita os direitos humanos, eu não quero saber, mas aqui dentro nós queremos uma polícia que respeite.” Ou, em resumo: “Eu só me preocupo com meu umbigo, não me interessa o que está acontecendo no resto da sociedade”. Eu sei que não era essa a intenção da frase, mas é essa a mensagem que ela está passando pra sociedade. Se vocês acham que a polícia é ruim e que mudar a polícia é uma causa a ser abraçada, então que seja assim para toda a polícia, e não só para a que atua na USP. Eu não vejo nenhum motivo para haver uma polícia diferente na USP. O único possível motivo seria esse da repressão política, mas aí voltamos aos itens 3 e 4: não há, a meu ver, repressão política e a polícia, como instituição, não está completamente desacreditada.

6) Quanto às outras reivindicações, como por exemplo sistema tomada de decisões na USP, a distribuição física do campus (que dificulta a circulação de pessoas e facilita a ação de bandidos), a decisão de deixar a estação Butantã fora do campus, a falta de vagas, recursos, professores etc, eu concordo com algumas e discordo de outras, em princípio, mas o ponto não é esse. O ponto é que eu não vejo os estudantes olhando a universidade como parte de algo maior. Toda reivindicação já parte da premissa de que a universidade vai continuar a ser mais ou menos o que sempre foi, com alguns pequenos ajustes. Ninguém parece querer pensar além. E é muito decepcionante ver que as pessoas que teriam o maior potencial para enxergar além, para pensar em alternativas muito mais ambiciosas e revolucionárias (no bom sentido!), ficam perdidas se debatendo e se desgastando dentro de um espaço de alternativas limitadíssimo e com validade expirada. Como eu já disse antes pelo Facebook, parece que ninguém está disposto a PENSAR. Eu, como não tenho medo de perguntas difíceis e como gosto de ir a fundo mesmo nos problemas, começaria a repensar todo o movimento estudantil e todo leque de reivindicações com base no seguinte questionamento: a USP precisa mesmo existir? Calma, calma! Antes de me sentenciarem e me executarem, esclareço que não estou dizendo que não. Não estou respondendo à pergunta, estou apenas fazendo a pergunta. E fazer perguntas – principalmente as perguntas difíceis – é a única maneira de entender de verdade um problema e chegar a soluções que não sejam apenas "pra inglês ver".